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CRIADOR, VOCÊ SABE O QUE É ACONSELHAMENTO GENÉTICO?

A cinofilia mundial está passando por um processo de mudança de paradigmas nas últimas décadas, que em grande parte está sendo impulsionado por duas áreas da sociedade: por um lado, o desenvolvimento científico na área da genética canina tem possibilitado muitas aplicações destas descobertas para o melhoramento genético canino. Por outro, a pressão da sociedade em prol da produção de cães mais saudáveis tem também surtido um efeito no processo de criação. Embora infelizmente esta pressão tenha direcionado mudanças drásticas e autoritárias em alguns países, como proibições de criação de algumas raças, de forma geral pode-se dizer que uma sociedade mais bem informada sobre o processo de criação tem o potencial de contribuir para a melhoria da qualidade deste mercado.

                No entanto, é necessário que cinófilos, cientistas e sociedade atuem efetivamente em conjunto para a melhoria da saúde e bem-estar na criação, e não uns contra os outros. Para tanto, é imprescindível a melhoria na qualidade da informação que chega a cada uma destas esferas. É muito comum que cinófilos desconheçam como a ciência já possui disponibilidade de ferramentas que possam auxiliar nos mais diversos desafios da criação de cães. Em parte, esta falta de conhecimento vem do fato de serem assessorados unicamente por profissionais médicos veterinários que, no Brasil, possuem uma formação incipiente em genética. Apesar de estarem legalmente habilitados para atuar na área, o médico veterinário graduado, quando muito, teve em sua formação dois semestres relacionados à genética, sendo a maior parte (senão a totalidade) voltada para animais de produção. Para piorar a situação, a maioria das grades curriculares das numerosas faculdades brasileiras não possuem absolutamente nenhuma disciplina da área da genética animal, muito menos para animais de companhia. Esta grande deficiência na formação profissional tem um resultado nada positivo na cinofilia: o profissional que o criador está habituado a consultar sobre todos os assuntos referentes à criação, não está preparado para informar corretamente o criador (a não ser que seja especializado em genética, o que é muito raro).

                Para tornar a situação ainda mais complexa, vemos um crescimento expressivo de uma cultura anti-cinófila na sociedade como um todo, o que inclui a classe veterinária. O número expressivo de cães sem raça definida em situação de abandono, unido à paixão do ser humano pela espécie canina contribuem para influenciar a falta de raciocínio lógico sobre a utilidade de cães de raça. Não é objetivo deste texto enumerar a forma como cães de raça podem ser úteis ao ser humano, sendo algo que qualquer cinófilo conhece e respira. No entanto, a atitude passional da sociedade frente ao abandono e sofrimento animal faz com que esta valorize a utilização de cães de raça para os mais variados trabalhos em prol de nossa espécie, mas desvalorizem sua criação. Ou seja: a lógica passa longe da bandeira “não compre, adote”. Uma terceira questão que contribui, e muito, para o crescimento deste sentimento anti-cinófilo é a proliferação de canis clandestinos, ou mesmo canis oficialmente registrados, mas com práticas inadequadas de criação. Infelizmente, como acontece em todas as esferas das relações humanas, bons criadores acabam sofrendo devido à atitude dos maus “criadores”.

                Neste sentido, a área científica da genética está à disposição da sociedade, em uma tentativa de contribuir para este impasse. A ciência, sendo a terceira esfera citada anteriormente, também possui sua parcela de culpa no problema, pois tem como péssimo hábito o isolamento dentro de sua “torre de mármore”, produzindo ciência que é consumida somente por cientistas. Apesar de algumas modificações neste cenário na última década, a divulgação de dados científicos para a parcela da sociedade que tem a real necessidade dos mesmos, e que será beneficiada pelo conhecimento, ainda é pouco eficaz, e pouco valorizada no mundo acadêmico.

                Nascido em 2016 neste contexto social discutido até o momento, o “Grupo Genética Canina” foi concebido como a união de profissionais de diferentes especialidades da área da medicina veterinária, todos com ao menos mestrado e doutorado em suas áreas de atuação. A responsável pela criação deste grupo, e coordenadora dos trabalhos é a bióloga e geneticista Fabiana Michelsen de Andrade, que possui mestrado, doutorado e pós-doutorados na área da genética, com foco atual na pesquisa em Melhoramento Genético Canino, como integrante do grupo MegaGen da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Na Universidade, são desenvolvidos trabalhos de pesquisa sobre genética canina, em conjunto com o professor e zootecnista Dr. Jaime Araújo Cobuci, um cientista de renome na área do melhoramento genético animal.

O Grupo Genética Canina possui um grande foco na produção e divulgação de conteúdo científico para esclarecimento de cinófilos e interessados em cães de raça, especialmente no sentido do melhoramento genético voltado para saúde e bem-estar. Este conteúdo costuma ser produzido de maneira conjunta pelos profissionais das diferentes áreas do Grupo, garantindo que cada um só atue e informe sobre sua própria área de atuação. A maior parte destas informações é periodicamente divulgada de forma aberta no site www.geneticacanina.com e em redes sociais (@genetica.canina), e também através de cursos fechados, atualmente a maior parte de maneira on-line.

                Outra linha de atuação do grupo é um trabalho ainda pouco conhecido no Brasil, mas amplamente utilizado e aceito por cinófilos do primeiro mundo, denominado de “Aconselhamento Genético”. Esta é uma das áreas de atuação do Biólogo, que está habilitado para atuar no processo tanto na área humana como na veterinária.  Esta área, em conjunto com o Melhoramento Genético (área de atuação tanto do Biólogo como do Médico Veterinário e do Zootecnista) possibilita um trabalho centrado na melhoria da qualidade da criação.

        No Brasil, o aconselhamento genético é feito especialmente na medicina humana, e auxilia casais a entenderem os riscos de nascimento de filhos com doenças genéticas. Já em países desenvolvidos, o aconselhamento genético para criações de pequenos animais vem se expandindo, e contribuindo muito para a diminuição da prevalência de doenças genéticas comuns de cada raça. Afinal, diferente da reprodução na espécie humana, a criação de cães pode e deve ser direcionada com o objetivo de melhoramento genético em cada raça, e o auxílio para a escolha dos melhores casais a serem reproduzidos é o foco central da atuação do geneticista neste processo.

        Boa parte do processo de aconselhamento depende de um trabalho em conjunto com o médico veterinário, uma vez que avaliação clínica, emissão de laudos de saúde e diagnósticos de doenças é uma competência específica desta profissão. Assim, o aconselhamento genético de qualidade só pode ocorrer com a documentação correta dos animais envolvidos (pedigrees), e com a participação do médico veterinário realizando avaliações clínicas de seus pacientes e emitindo laudos adequados.

                O Grupo Genética Canina foi sonhado no ano de 2013, durante o processo de escolha e aquisição de um filhote da raça Golden Retriever pela geneticista coordenadora. Com formação e experiência prévias na área da genética, Fabiana de Andrade vislumbrou a possibilidade de atuação na área da criação de cães, e iniciou seus estudos voltados para caninos, de forma auto didata, uma vez que no Brasil não existe nenhum outro profissional atuando na área. O cão Dublin Dior Oliver´s Kind foi o responsável pelo casamento entre as áreas da genética e cinofilia, e o causador de todo o processo de nascimento do grupo Genética Canina. Dublin faleceu subitamente aos 8 anos de idade, após cumprir seu papel de melhor filho e irmão mais velho que uma família poderia ter. Será para sempre lembrado em todos os cursos e palestras, e é em sua homenagem que o Grupo Genética Canina deseja se expandir e auxiliar mais e mais no processo de criação canina. Nos procure, estamos à disposição!

 

VEJA ALGUNS EXEMPLOS ONDE O ACONSELHAMENTO GENÉTICO PODE SER IMPORTANTE:

 

1)Na análise do coeficiente de consanguinidade (ou endogamia) de suas ninhadas...
Com endogamia muito elevada, o risco de nascimento de filhotes doentes é alto. Com endogamia baixa demais, é difícil repetir características desejáveis dos pais.

2) Na decisão no momento de adquirir novos padreadores e novas matrizes...

Analisando a composição genética de sua criação, é possível auxiliar no sentido da escolha de novos animais que irão contribuir para o objetivo de sua criação.


3) No aumento de chances de produção de filhotes saudáveis...

Todas as raças têm doenças que são muito comuns e que podem ser controladas com o método correto de criação. Criadores responsáveis levam em conta a saúde dos pais, mas nem sempre isto é suficiente. O aconselhamento genético pode contribuir para o controle de doenças comuns como a displasia coxo femoral, a luxação de patela, a persistência do ducto arterioso, entre várias outras.

 
4) Na previsão das pelagens possíveis em uma ninhada...

Alguns tipos de colorações de pelagens podem ser previstas apenas através da análise das cores dos pais, e algumas vezes também dos avós. Nem sempre o exame de DNA é necessário para isto, embora ele possa auxiliar em muitos casos. 

5) Na emissão de laudos genéticos para os filhotes de uma ninhada...

No caso do processo de reprodução dos animais ter ocorrido com todo o cuidado necessário para diminuir a chance de filhotes que tenham doenças genéticas, é possível emitir um laudo relativo à saúde esperada do filhote. Este laudo pode informar questões sobre o grau de consanguinidade e seu significado, chances aproximadas de doenças multifatoriais (como doenças ortopédicas, por exemplo), e resultados de exames de DNA dos pais, e o que os mesmos significam para os filhotes. Em uma criação que prime pela saúde da ninhada, este tipo de documento demonstra para o comprador a qualidade do trabalho do criador, e agrega valor ao filhote.


6) Na emissão de laudos para processos judiciais...

De posse de toda a documentação dos cães envolvidos (pais, filhotes e outros parentes), e nos casos em que o criador trabalhou da forma correta para diminuir as chances de doenças na ninhada, trabalhamos com emissão de laudos para serem utilizados em processos judiciais contra o criador. 

7) Na escolha de testes de DNA adequados para cada raça...  
Existem várias doenças cujos testes de DNA já estão disponíveis no mercado internacional, e até mesmo no nacional. Exames de DNA podem ser muito úteis no controle de doenças sérias, e em alguns casos podem até garantir que os filhotes não irão desenvolver a doença testada. No entanto, a escolha dentre os testes disponíveis deve ser orientada por um profissional, de maneira a otimizar os gastos do criador. 

Fabiana Michelsen de Andrade, MSc, PhD

Bióloga e Geneticista – CRBio-03: 110385

Pesquisadora do grupo MegaGen – UFRGS

Coordenadora do Grupo Genética Canina

Consultora AD HOC do Conselho Cinotécnico da CBKC

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